Um dos assuntos que surge recorrentemente nos media, é o famigerado problema da corrupção, esse Adamastor dos nossos tempos, monstro voraz que impede o desenvolvimento da sociedade em direcção a um imaginário futuro onde o progresso é lei.
O futebol, os partidos políticos, as empresas, a finança e os pequenos e grandes traficantes, são aos olhos do cidadão apontados como os fautores do atraso, amoralidade e fracasso do regime na construção de um modelo a seguir por outrem. Protesta-se contra a ausência de um espírito cívico que deveria ser intrínseco à própria condição de súbditos livres de um Estado de direito. Não me repugna a palavra e o conceito per se de súbdito. É o que fomos, somos e seremos. A cidadania não é desconforme a submissão de um conjunto nacional ao império de uma Lei e uma Bandeira que definem a sua existência na forma de Estado independente.
No seu afã masoquista, a imprensa - curiosamente dependente dos interesses económicos -, acusa, distorce factos, acicata velhos e conhecidos ódios, suscita inesperadas invejas e articula saborosos ajustes de contas. Cinco séculos de cultura de delação, medo, indexação de livros e proibições achadas ao acaso do mero preconceito, encontram terreno fértil num país em endémica crise económica. A corrupção existe, é visível na aparência e suspeita-se. A inveja faz o resto.
Hoje é um dia triste para Portugal. A imolação pelo fogo de um homem, proprietário de um restaurante na Costa de Caparica, é a demonstração plena do desespero calado e sofrido por tantos que organizando os seus pequenos negócios, foram atingidos pela carestia, rarefacção de clientela ou atraso no pagamento de dívidas ao fisco, muitas vezes por total incapacidade económica para o cumprimento das obrigações legais. Transformado numa pira viva dentro do seu local de trabalho, aquele homem é um preocupante e evidente sinal do despotismo da actuação de certa autoridade, cega e surda perante a realidade quotidiana de quem tem parcos recursos económicos.
A Itália, a pátria universal da corrupção, continua a cantar, a beber chianti, a fabricar automóveis e roupas de luxo, enquanto a economia paralela representa uma parte substancial do seu sucesso. Habituados a esta evidência, os europeus encolhem os ombros e encaram os transalpinos como uns adoráveis foliões, onde o bom gosto e a habilidade são tão imagem de marca como a Ferrari, D&G, Versace ou Alfa Romeo. A Itália deve, mas não teme. Portugal, devendo, teme sem razão. Temendo, obriga os seus súbditos-cidadãos a imolar-se pelo fogo. Uma vez mais, após as fogueiras se terem apagado há quase trezentos anos. Estamos todos de luto.
Um comentário:
É uma vergonha. Não podem ser mais clementes com os pequenos?
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