sexta-feira, 23 de maio de 2008

A Grande Farra...


Ontem não tive disposição para passar ao papel fosse o que fosse e desta forma, dediquei-me a espionar o que se passa no éter blogosférico. Como é evidente, interessam-me apenas aqueles recantos da web em que os autores oferecem uma perspectiva própria do nosso mundo, não se limitando a transcrever a derradeira reportagem deste ou daquele jornal internacional, ou pior ainda, a reescrever um ou outro dado estatístico habilmente cozinhado ao lume brando do interesse corporativo.

O desafio aqui lançado para que comentemos alguns dos alegados males da nossa sociedade arrivista e impenitente para com o próximo, veio mesmo a propósito, até porque tenho a oportunidade de chamar a atenção das nossas hostes para aquilo que se passa no imaginário campo contrário.

Blogs monárquicos existem às dezenas e alguns com uma actividade muito intermitente. Uns ocupam-se de tradicionais preocupações de estilo, como heráldica e toda a parafrenália simbólica que dá cor a sonhos de redenção. Podemos ler aqueles que o são pela simples opção do autor, sem que a reivindicação do posicionamento na res publica seja a obsessiva constante que tudo o resto esquece. E finalmente existem os combativos, agregadores de vontades e que na generalidade se encontram perfeitamente inseridos nos duelos amplamente proporcionados pela catadupa de notícias divulgadas por todos os veículos de informação. 

Após algumas horas de leitura, cheguei a uma primeira conclusão que decerto merecerá mais objectividade e procura factual. Os blogs monárquicos são na sua esmagadora maioria, escritos por gente perfeitamente capaz de obedecer ao primado da Lei sobre o arbítrio. É raríssimo encontrarmos um declarado insulto, uma insinuação soez, o desrespeito por este ou aquele titular de um órgão de soberania. Se lemos muitas páginas de críticas  - por vezes virulentas - ao estado de coisas, nunca vislumbrámos qualquer indício de enxovalho, de degradação da esfera pessoal deste ou daquele homem de Estado, por muito criticado que ele seja no plano da sua acção no campo político. Nunca. Nestas horas de incerteza, é consolador  pensar que tudo isto não advém do mero acaso, nem da cobardia ou acanhamento. Todos nós temos um princípio básico de violência latente, susceptível de explodir em momentos de pressão, exaspero pessoal ou colectivo e apesar disso, a contenção surge como magnífico princípio de controle do irracional que leva a todas as injustiças, julgamentos apriorísticos de outrem e situações que se tornam irresolúveis. Isto chama-se simplesmente, decência. 

Há algo nos monárquicos  que os impele para o respeito da legalidade e do direito do seu semelhante, especialmente naquilo que lhe é mais precioso, ou seja, a sua idoneidade profissional, a intimidade e credibilidade da intencionalidade sua acção na sociedade. É esta uma conclusão aparentemente surpreendente, pois seria lógico situarem-se os malhados  entre aqueles que tudo poderiam levar a cabo para a derrota de instituições consideradas odiosas e nefastas para o colectivo nacional. Poderiam os malhados ter todo o interesse no descrédito de uma classe política que mantém esta dúbia e mal contabilizada súmula de direitos e deveres desrespeitados pelos próprios legisladores. Neste campo, nesta trincheira, não existem Miquéques ou Lêndeas capazes de engendrar quaisquer "Marqueses da Bacalhoa". Não existe um único Almeida interessado em fabricar uma bomba para minar o Estado de Direito. Não existe um Costa que pretenda organizar bandos de caceteiros que intimidem imaginários opositores, enfim, não existe qualquer indício de pretensão de controle do semelhante. Poderiam ainda os malhados organizar facilmente campanhas de difamação, bastando para isso reeditar aquilo que os republicanos habilidosamente urdiram durante quatro décadas, até atingirem os seus muito contestáveis fins. O seu triunfo criou  terríveis precedentes na sociedade que os normalizou e é hoje, mais do que outrora, o ácido corrosivo que mina a confiança na livre expressão ou associação, confundindo-as com sórdidas manigâncias, prepotência ou veículo de interesses ocultos e lesivos do bem comum. Num povo sempre receptivo a teorias da conspiração e contador de histórias de aceitação à luz de candeias num qualquer cemitério dos arredores, o boato e a maledicência ofuscam o simples recurso da procura da verdade, ou melhor ainda, daquilo que verdadeiramente interessa.

Fiquei verdadeiramente confundido com o que se passa no alegado campo verde-rubro. Chovem os mais chãos insultos, atribuem-se as mais debochadas e desonestas intenções, destroem-se reputações desacreditam-se honorabilidades. Preto no branco, duvida-se da simples intenção, do mais ínfimo propósito, desta ou daquela frase e até de uma simples palavra. Em suma, desacredita-se o sistema no seu todo, como se este fosse um grande pasto onde gordas vacas  tudo devoram compulsivamente, ficando a imensa maioria condenada a permanecer fora do redil, lutando ferozmente por este ou aquele fio de palha. É a realidade que facilmente observamos em blogs que pertencem a autores muito próximos da República e a quem nada mais interessa que a satisfação de uma mesquinha vingança pessoal ou na preventiva destruição de um potencial adversário. Uma vergonha  que atinge as raias do ridículo, porque os prevaricadores ainda não compreenderam que a derrota dos seus é o seu próprio aviltamento e pressupõe o desaparecimento de tudo aquilo em que participa.

Neste aspecto, somos superiores, somos decentes e sendo-o, somos mais fortes.

4 comentários:

Pedro Fontela disse...

Nuno,

Não quero deitar água fria nesse ânimo mas… era de considerar que os monárquicos provavelmente não vivem do ar. Assim sendo a sua maioria já fez as pazes com tudo e mais alguma coisa para ter uma fatia do bolo, sendo assim colaborantes no estado de coisas actual – tal como o foram no rotativismo monárquico. Conclusão lógica, não existe crítica feroz porque não existe oposição feroz. No fundo todos sabem que não existe um projecto credível que seja mobilizador.
Quanto aos defensores da República que criticas pelas suas cenas de praça, enfim… parece-me daquelas generalizações sem grande significado. Se há mais republicanos que monárquicos então seria normal que a maioria dos insultos também estivesse nesse lado quanto mais não seja por numero.
E já agora acrescento que na minha experiência as ideias mais perigosas, perversas e devassas que já li na minha vida sempre foram expressas com a maior cortesia e amabilidade – tirando claro para os alvos desses mesmos escritos – e por isso o facto de não usarem linguagem brejeira não os torna mais recomendáveis, apenas menos esteticamente ofensivos para quem não tem nada a perder nos seus ataques.

PS: não sei se deu para perceber :) mas considero o conservadorismo como inimigo mortal.

Nuno Castelo-Branco disse...

Percebi muito bem o que disseste e parece bastante lógico. No entanto, creio que há limites que não devem ser passados e o que na verdade é hoje "conservador", é a mania da destruição do alheio, a vingança por pequenos nadas e aqueles a que no teu post chamas pedantes e gente sem capacidade de encaixe. é que algumas coisas que se dizem não são simples e engraçadas brejeirices. O mundanismo é isso mesmo, habilmente vestido de" discussão da actualidade". simplesmente insuportável.

cristina ribeiro disse...

Sem querer generalizar, ao ler este post, Nuno, veio logo à mente um comentário tão insultuoso, daqueles indizíveis, que depositaram na caixa de comentários de Luís Bonifácio: este é um exemplo de linguagem que odeio...

Samuel de Paiva Pires disse...

Concordando sem dúvida contigo Nuno, porém, o que me parece que falta a muitos monárquicos é algum sentido de actualidade, exactamente aqueles de que falas que se preocupam com a parafrenália heráldica e simbologia. Creio que actualmente, quer a monárquicos, quer a republicanos, o que falta é também aquilo de que Maquiavel falava quando dizia que pouco importaria a forma, república ou monarquia, essa coaduna-se com as circunstâncias vigentes e com o objectivo que se quer dar ao Estado. Falta portanto, sentido de Estado. Se bem que Maquiavel diria que a república garante maior estabilidade interna do país, enquanto a monarquia serve os propósitos mais expansionistas, se hoje fosse vivo, parece-me que mudaria de opinião ao olhar para as actuais monarquias constitucionais europeias... Não só o sentido de Estado como também o sentido de responsabilidade individual e de respeito pelo outro fazem muita falta a muita gente!