Depois de ler as respostas aqui ao outro post (especialmente a do Samuel e a do Mike) acho que tenho a obrigação de especificar umas coisas e pôr os pontos nos is noutras.
Em primeiro lugar a medida sugerida não seria em nada radical dado o track record do sector conservador nesta área. Seria apenas justiça servida sobre a forma da pena de talião, olho por olho dente por dente. Nada mais justo.
Depois acho que posso comentar sobre o papel das elites porque escrevi uma tese sobre elites portuguesas. Em primeiro lugar convém especificar ao que nos referimos. Elites no sentido de ocupação de poder ou de vanguarda cultural? Não são grupos coincidentes no nosso país. As elites em termos de poder tendem a servir-se a elas mesmas e em Portugal sistematicamente recusaram as suas responsabilidades de liderança cultural e cívica o que levou uma e outra vez à sua queda e substituição quando o poder bruto lhes falha. A sua relação com as mentalidades tem sido tradicionalmente um papel de manutenção das coisas tal como elas estão por medo de perturbar o status quo que os mantém – uma exploração sem vergonha dos preconceitos de uma populaça semi-educada.
Agora vem o que me incomodou mais… o Samuel vem com uma conversa que eu já conheço de ginjeira… eu não tenho nada contra e tal e coisa mas… (só faltou dizer que tinha muitos amigos que eram para completar a intervenção estereotipada). A ideia que fica é que no fundo é tudo muito bonito quando é socialmente invisível. A partir do momento que a tal diferença é assumida e vivida passamos a ter “bichas”, ou seja, o que eu assumo aqui é que o ideal seria manter uma fachada hipócrita para não incomodar o “bom” povo português. É uma ideia que sobre a capa de uma suposta neutralidade é de uma agressividade enorme pela sua normalização não da aceitação pacífica do “outro” mas pela normalização dos costumes e supressão individual (pela reprovação colectiva).
Será que estes dois rapazes que trocam afectos em público já estão na categoria "bicha"?
Por fim a questão dos casamentos e adopções. É rídiculo adiar esta legislação por razões de igualdade de direitos legais (e não me venham com a treta as uniões de facto porque não são a mesma coisa nem de longe nem de perto) e pelas oportunidades de outros seres humanos (neste caso crianças) de terem um lar normal – no fundo é dizer que pelo preconceito infundado de uns devem pagar todos até que o grupo em falta resolva mudar de ideias. E pelos exemplos que temos de outros países parece-me seguro afirmar que a sociedade não vai entrar em colapso com a permissão de casamentos gay. Tal como não se desmoronou com a igualdade racial, de sexo, etc.
Por fim a questão da definição da nossa sociedade. Eu serei o primeiro a dizer que nem tudo o que vem de fora tem um valor intrinsecamente superior ao que nós fazemos – não tenho complexo de inferioridade por ser deste país – mas também serei o primeiro a apontar as falhas que temos. E caro Samuel é preciso admitir que a nossa sociedade é profundamente provinciana nos seus gostos, maneirismos, hábitos, etc. Trata-se simplesmente de aceitar factos. Nunca ouviram dizer que o primeiro passo para qualquer solução é admitir que existe um problema?
7 comentários:
Como sempre, as reclamações homosexuais por mais tolerância humanista e civilizada primam pela intolerância raivosa e gratuita.
«Seria apenas justiça servida sobre a forma da pena de talião, olho por olho dente por dente. Nada mais justo.» Ah, que coisa tão civilizada!...
«É preciso normalizar a vivência da diferença e isso implica um nivel de civilização cosmopolita que pelos vistos ainda não somos capazes de mostrar.»
É uma forma de ver as coisas. Para a aparente minoria que padece da aberração de gostar de mulheres, o que defende corresponde a normalizar a vivência anormal e isso implica um nível de degradação pseudo-cosmopolita que pelos vistos desse lado da rua não são capazes de enxergar.
Se é para mexer na lei do casamento, comece-se pela opção mais compatível com as leis da natureza: o casamento polígamo heterosexual. Pelo menos essa sempre é benéfica à natalidade e a longo prazo à Segurança Social.
Não, a avaliar pela fotografia os dois rapazes não são bichas: são libélulas mesmo.
A tolerância e aceitação costumam ser ruas de dois sentidos, é senso comum. Se de um lado se oferece hostilidade então não vejo razão para oferecer a outra face.
Depois, a normalidade numérica é uma questão estatistica irrelevante para a determinação do certo e errado e quem não percebe isso tem que voltar ao liceu para ter aulas básicas de filosofica e lógica.
Como podem ver meus caros, I rest my case. Cretinos recalcados que mereciam o destino - nota ao pateta alegre que comentou sem argumentar: o seu comentário em tom ofensivo será o primeiro e último.
Caro Pedro, em primeiro lugar devo agradecer-lhe a exposição e, porque não, confessar-me um privilegiado. (Não há ironia de espécie alguma no que lhe digo). Já ouvi dizer, sim senhor, que o primeiro passo para qualquer solução é esse que preconiza. E concordo, eu que sou defensor da teoria de que se fizermos as coisas sempre da mesma maneira jamais poderemos esperar a mudança. Contudo, quando no meu comentário lhe disse que achava a medida um tanto ou quanto radical, estava a referir-me ao acto de sodomizar. Talvez por, na minha interpretação o ter levado a sério. Se era o caso, apenas lhe digo que continuo a achá-la da mesma forma. Mesmo estando de acordo com muito que agora descreve.
Felicito-o por este "post". Pela forma como escreve (que conheço daqui), sobretudo porque estas razões que expõe, não tendo nada de "inato", mas são suas ( sei que isto soa mal mas faz sentido). A forma como nos leva a estar totalmente de acordo é francamente inteligente. Ainda o hei-de ver a Ministro. (aqui é capaz de responder : chiça !). Ok. Paciência.
JMB
Não é um mal português, nada de persistir no masoquismo de sempre. A nossa sociedade global europeia tornou-se muito provinciana, imitando - mal e com vergonha - tudo aquilo que os americanos fazem e impõem. A única coisa que é questionável nisto tudo, é a inconsciente ghettização de vários sectores, ajudando paradoxalmente, aqueles que mais preconceitos têm. Há que ter o sentido prático das coisas. Parece uma tirada vazia de conteúdo e afinal é a clara verdade.
Mike,
Talvez o seja... mas há de reconhecer um certo travo de doçura na ironia de uma punição tão judaico-cristã :)
José Barbosa,
Fica a nota e o elogio :)
Nuno,
Não é um mal português exclusivo mas acho que podemos ver que nem todos os países têm tantos complexados, basta olhar para Espanha aqui mesmo ao lado. Não percebi o que queres dizer com o sentido prático das coisas.
Caro Pedro Fontela,
Se me é permitido entrar nesta discussão, direi que concordo inteiramente com aquilo que diz sobre o provincianismo e o preconceito da nossa sociedade (e não, não é a única assim no mundo dito "civilizado", antes fosse...) e a necessidade de desmistificar as questões da homosexualidade, como de outros preconceitos que continuam a dominar-nos. Mas não posso é concordar com a defesa de soluções radicais (ainda que alegóricas), que sempre vão cair no extremismo oposto e suscitar reacções tão primárias como elas. "Olho por olho, e o mundo estaria cego" - claro que sabe quem disse isto (e praticou!), e aí é que está a verdadeira sabedoria. As mentalidades mudam-se com persistência e medidas inteligentes, embora (nisso também lhe dou razão) sem cedências à normalidade pacóvia. Mas não se mudam com boutades espampanantes, que apelam ao que há de mais primitivo nesses pacóvios.
Em suma, discordo da forma e não do conteúdo do seu post anterior.
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