sexta-feira, 11 de abril de 2008

Acordo ortográfico, PALOP e CPLP

Desde o anúncio da assinatura do acordo ortográfico entre Portugal e o Brasil, muitos têm sido aqueles, que sem uma explicação credível ou uma argumentação insusceptível de contestação, pretendem demonstrar a inexequibilidade ou a irreversibilidade do mesmo. Na imprensa há quem anuncie a morte da língua portuguesa enquanto outros desesperam, apontando o acordo como a derradeira oportunidade de acompanharmos a evolução dos nossos parceiros lusófonos da CPLP. Se o acordo afecta apenas uma ínfima parte das palavras que habitualmente usamos - sendo este então o argumento decisivo dos que lhe são favoráveis -, vem contudo afastar a língua portuguesa falada na Europa, das raízes etimológicas que partilha desde o início da sua caracterização autónoma de idioma do extremo ocidente peninsular, com todas as outras da Europa d'aquém Oder , sejam elas o francês, o italiano, espanhol, alemão ou inglês. Considerando o erro da normalização pós-1910 um facto consumado, será decerto supérfluo um afastamento ainda maior consagrado pelo pomposo nome de Acordo que entretanto, preenche a sempre necessária agenda política. Estando assinado deverá ser implementado, devido a razões impostas pela exígua dimensão do nosso país e os decorrentes compromissos inter-governamentais.

Continuamos a criar problemas desnecessários, porque os verdadeiros e de difícil resolução são constantemente escamoteados ou relegados para uma incerta resolução futura. Parece ser absolutamente imperiosa, a necessidade da existência de recursos para o ensino do português nos países nascidos das independências de 1974-75. A escassez de meios de alguns - Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Moçambique - e o desbaratar de riquezas por parte activas minorias que concentram totalitariamente o poder - Angola -, exacerbam o problema do ensino que se torna particularmente grave no nível primário, a base essencial da educação. À falta de quadros docentes habilitados, soma-se a penúria de equipamento escolar em praticamente todos os países dos PALOP. O problema material acompanha e pode condicionar de forma decisiva, qualquer intenção ou programa extensivo do ensino do português.

Em Portugal a publicação de manuais é um dos grandes negócios das editoras, pelo simples facto da liberalidade de escolha dos mesmos por parte das escolas, sem que exista uma verdadeira política de opção de conteúdos. Há quarenta anos era normal o livro de leitura da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª classes, passar dos irmãos mais velhos para os mais novos, sendo aproveitado durante muitos anos como base essencial de trabalho. A chamada "modernidade" impôs não um modelo, mas pelo contrário, a total ausência do mesmo e desta forma, a anarquia alastrou aos outros níveis do ensino, sejam eles o antigo preparatório ou o liceal. Vivemos a época dourada do primado do negócio sobre o do interesse da comunidade. Assim sendo, como poderão os portugueses esperar a existência de facto, de uma convenientemente propalada comunidade de mais de duzentos milhões de lusófonos? É irrealista e raia a mera propaganda para satisfação da vaidade nacional.

Para que consigamos consolidar a ainda bastante ténue radicação do português em África - nas cidades, pelo menos -, será necessário um enorme esforço conjunto entre as autoridades nacionais e as suas congéneres da CPLP. Portugal deverá dar o exemplo, padronizando manuais escolares, garantindo um longo período de vigência dos mesmos e permitindo edições que satisfaçam as necessidades económicas de quem publica. A educação é também um negócio e disso ninguém hoje duvida. O Estado português tem a obrigação moral de proceder a uma completa reorganização do sistema de bases da alfabetização - escola primária - dentro das nossas fronteiras e posteriormente, em colaboração com as autoridades dos PALOP + Timor, executar um criterioso estudo para adopção de manuais adaptados a todo o espaço lusófono. Poderá ser uma proposta aparentemente irrealista mas é a mais desejável, porque facilita a impressão por parte das editoras, evita o desperdício e racionaliza os parcos recursos disponíveis. O Brasil será um problema à parte e não desprezível, mas dado o seu gigantismo e a consolidação do seu português num espaço onde a educação já tem séculos e contou com o contributo de populações originárias das mais diversas regiões do globo, pretenderá decerto seguir a sua própria política educacional. Tal não impedirá contudo, a existência do trabalho que até hoje tem sido realizado e que conduziu ao chamado "Acordo", assim como a colaboração na recruta de docentes.

Os países africanos de "expressão portuguesa" são entidades que ainda procuram a sua própria cristalização como nações autónomas, num espaço geográfico onde as actuais fronteiras, obedeceram aos interesses e contingências impostas pelos antigos poderes coloniais. Em Moçambique, o português pode ser o elo fundamental para uma identidade perfeitamente autónoma na África austral, e a sua presença na Commonwealth britânica, poderá tornar-se num simples acordo com fins económicos e de progresso material das populações daquela vasta zona. De facto, sendo o único país a ter o português como língua oficial - delimitado como está pelos seus vizinhos anglófonos -, Moçambique possui o instrumento essencial à sua sobrevivência como unidade política e as autoridades de Maputo estarão decerto conscientes da situação.
O início do processo terá de partir do governo português, estabelecendo-se uma verdadeira política de cooperação na área da educação que se abrirá à participação de empresas - em termos a negociar pelo Estado - e de desaproveitados recursos humanos que no nosso país não encontram lugar na carreira docente. Existem perspectivas encorajadoras neste sentido e urge passar à fase de elaboração de um efectivo projecto de intervenção. Este é de facto, o verdadeiro problema que a língua portuguesa enfrenta, remetendo todos os outros para a categoria do simples malabarismo político de ocasião.

Nota: a não perder, o seguinte texto de Fernando Villas Boas

2 comentários:

Anônimo disse...

Duvido muito que se consiga fazer algo de bom com esta gete que nos governa. São os directos responsáveis pela situação a que chegámos, tanto em Portugal, como nos PALOP.

Anônimo disse...

Tem razão, mas onde teremos a vontade para o fazer? Com o Cavaco ou o Sócrates? Impossível.
Pedro Matias
Lisboa