(Ler ainda o artigo do Tiago sobre o desajustamento estratégico de Washington. Em conjunto elaborámos estes dois artigos para o Pacto, jornal do Núcleo de Estudantes de Relações Internacionais do ISCSP, também publicados no Nostrum Symposium, aqui e ali)
Embora a realidade do declínio da hegemonia dos Estados Unidos da América seja evidente aos olhos de todos, algo desde há muito teorizado sobre a forma dos ciclos de poder e hegemonia internacional, até porque empiricamente observável em termos de domínio material pelo hard power, tal não significa no entanto que os interesses dos Estados Unidos estejam ameaçados, tal como procuraremos demonstrar sucintamente.
Se com o fim da Guerra fria entrámos na era da unipolaridade no sistema internacional, com Francis Fukuyama a clamar pelo Fim da História através do aguardado mas (ainda?) não concretizado efeito dominó de expansão das democracias liberais a todo o mundo, com um claro domínio material do sistema internacional por parte dos Estados Unidos e da aliança vencedora, isto é, a NATO, com o advento dos ataques terroristas ao World Trade Center em 11 de Setembro de 2001, ganharia um reforçado ênfase a tese do Choque de Civilizações de Samuel Huntington, implicitamente exaltada em Precisará a América de uma Política Externa, obra em que Henry Kissinger procura responder às necessidades de reajustamento norte-americano às rápidas mudanças no panorama internacional.
Em termos militares é claro o domínio norte-americano e transatlântico através da NATO, que se tem transformado para dar resposta a novas problemáticas numa bipolaridade entre o Ocidente e seus aliados contra o Terrorismo Internacional. Mas é também claro que o conceito de segurança abarca hoje áreas tão distintas como os direitos humanos, energia, ambiente ou desenvolvimento, o que faz com que os instrumentos de Washington estejam cada vez mais desadequados à realidade vigente, sendo insuficientes para responder a todos os inputs do sistema internacional.
Porém, em termos ideológicos é facilmente colocada em perspectiva a noção de que os ideais norte-americanos presidem à construção da Ordem Internacional vigente, em que o surgimento e/ou ressurgimento de novos actores como potências com um papel importante a desempenhar, acontece segundo as regras do jogo e da arena construída a partir do ponto central, os Estados Unidos, sendo de assinalar que em termos políticos a legitimidade internacional é construída com base nas formas democráticas de governo e nas economias de mercado.
Todo o sistema financeiro, económico e comercial a nível mundial tem a intervenção dos Estados Unidos, quer em termos públicos e directos através de organizações como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, quer através de meios privados, pela bolsa, pela banca e pelas suas empresas transnacionais que além fronteiras se instalam por todo o mundo e constituem o motor produtivo da economia mundial.
No recente artigo The Future of American Power, publicado na Foreign Affairs de Maio/Junho 2008, Fareed Zakaria faz um paralelismo entre a hegemonia norte-americana e a hegemonia do Império Colonial Britânico, onde demonstra que enquanto a queda do Império Britânico se deveu a termos económicos, ultrapassado no fim do século XIX pelos Estados Unidos e Alemanha, e posteriormente devassado com duas Guerras Mundiais, no caso dos Estados Unidos o seu declínio explica-se precisamente em termos políticos, pela falta de ajustamento de Washington às transformações no sistema internacional.
A influência sob a forma de hard power que os Estados Unidos têm vindo a perder é natural à luz do surgimento de outros actores e das transformações de um sistema internacional com centros de poder cada vez mais difusos, mas se o mundo está a mudar, é no sentido dos ideais norte-americanos, pelo que normativamente nos parece que o ajustamento dos instrumentos de Washington se deve dar por forma a permitir o domínio em termos de soft power.
Como refere Zakaria, estamos a entrar numa era pós norte-americana, em que os Estados Unidos continuam a ser o actor central decisivo para o funcionamento do sistema mas que têm que se adaptar para ocupar menos espaço e permitir que o jogo funcione segundo as regras por si criadas, onde os seus interesses não se encontram ameaçados porque são simultaneamente os interesses de todos os outros actores, que hoje em dia se pautam pela constante necessidade de desenvolvimento para os seus países, populações e organizações.
Para concluir, parece-nos salutar, em altura de eleições para a Presidência norte-americana, relembrar Paul Kennedy em A Ascensão e Queda das Grandes Potências ao considerar que a natureza liberal e muito pouco estruturada da sociedade americana (…) lhe dá provavelmente maiores hipóteses de se reajustar a circunstâncias mutáveis do que as que teria uma potência rígida e dirigista. Mas isso, por seu turno, depende da existência de uma liderança nacional que consiga compreender os mais amplos processos em funcionamento no mundo actual e que tenha consciência tanto dos pontos fracos como dos fortes da posição dos Estados Unidos enquanto procura ajustar-se ao contexto global em mutação, até porque, por ter tanto poder quer para o bem, quer para o mal, por ser a pedra angular do sistema ocidental de alianças e o centro da economia global actual, aquilo que faz, e o que não faz, é muito mais importante do que aquilo que qualquer das outras potências decide fazer.
Agora é esperar para vermos o que nos aguarda.
Embora a realidade do declínio da hegemonia dos Estados Unidos da América seja evidente aos olhos de todos, algo desde há muito teorizado sobre a forma dos ciclos de poder e hegemonia internacional, até porque empiricamente observável em termos de domínio material pelo hard power, tal não significa no entanto que os interesses dos Estados Unidos estejam ameaçados, tal como procuraremos demonstrar sucintamente.
Se com o fim da Guerra fria entrámos na era da unipolaridade no sistema internacional, com Francis Fukuyama a clamar pelo Fim da História através do aguardado mas (ainda?) não concretizado efeito dominó de expansão das democracias liberais a todo o mundo, com um claro domínio material do sistema internacional por parte dos Estados Unidos e da aliança vencedora, isto é, a NATO, com o advento dos ataques terroristas ao World Trade Center em 11 de Setembro de 2001, ganharia um reforçado ênfase a tese do Choque de Civilizações de Samuel Huntington, implicitamente exaltada em Precisará a América de uma Política Externa, obra em que Henry Kissinger procura responder às necessidades de reajustamento norte-americano às rápidas mudanças no panorama internacional.
Em termos militares é claro o domínio norte-americano e transatlântico através da NATO, que se tem transformado para dar resposta a novas problemáticas numa bipolaridade entre o Ocidente e seus aliados contra o Terrorismo Internacional. Mas é também claro que o conceito de segurança abarca hoje áreas tão distintas como os direitos humanos, energia, ambiente ou desenvolvimento, o que faz com que os instrumentos de Washington estejam cada vez mais desadequados à realidade vigente, sendo insuficientes para responder a todos os inputs do sistema internacional.
Porém, em termos ideológicos é facilmente colocada em perspectiva a noção de que os ideais norte-americanos presidem à construção da Ordem Internacional vigente, em que o surgimento e/ou ressurgimento de novos actores como potências com um papel importante a desempenhar, acontece segundo as regras do jogo e da arena construída a partir do ponto central, os Estados Unidos, sendo de assinalar que em termos políticos a legitimidade internacional é construída com base nas formas democráticas de governo e nas economias de mercado.
Todo o sistema financeiro, económico e comercial a nível mundial tem a intervenção dos Estados Unidos, quer em termos públicos e directos através de organizações como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, quer através de meios privados, pela bolsa, pela banca e pelas suas empresas transnacionais que além fronteiras se instalam por todo o mundo e constituem o motor produtivo da economia mundial.
No recente artigo The Future of American Power, publicado na Foreign Affairs de Maio/Junho 2008, Fareed Zakaria faz um paralelismo entre a hegemonia norte-americana e a hegemonia do Império Colonial Britânico, onde demonstra que enquanto a queda do Império Britânico se deveu a termos económicos, ultrapassado no fim do século XIX pelos Estados Unidos e Alemanha, e posteriormente devassado com duas Guerras Mundiais, no caso dos Estados Unidos o seu declínio explica-se precisamente em termos políticos, pela falta de ajustamento de Washington às transformações no sistema internacional.
A influência sob a forma de hard power que os Estados Unidos têm vindo a perder é natural à luz do surgimento de outros actores e das transformações de um sistema internacional com centros de poder cada vez mais difusos, mas se o mundo está a mudar, é no sentido dos ideais norte-americanos, pelo que normativamente nos parece que o ajustamento dos instrumentos de Washington se deve dar por forma a permitir o domínio em termos de soft power.
Como refere Zakaria, estamos a entrar numa era pós norte-americana, em que os Estados Unidos continuam a ser o actor central decisivo para o funcionamento do sistema mas que têm que se adaptar para ocupar menos espaço e permitir que o jogo funcione segundo as regras por si criadas, onde os seus interesses não se encontram ameaçados porque são simultaneamente os interesses de todos os outros actores, que hoje em dia se pautam pela constante necessidade de desenvolvimento para os seus países, populações e organizações.
Para concluir, parece-nos salutar, em altura de eleições para a Presidência norte-americana, relembrar Paul Kennedy em A Ascensão e Queda das Grandes Potências ao considerar que a natureza liberal e muito pouco estruturada da sociedade americana (…) lhe dá provavelmente maiores hipóteses de se reajustar a circunstâncias mutáveis do que as que teria uma potência rígida e dirigista. Mas isso, por seu turno, depende da existência de uma liderança nacional que consiga compreender os mais amplos processos em funcionamento no mundo actual e que tenha consciência tanto dos pontos fracos como dos fortes da posição dos Estados Unidos enquanto procura ajustar-se ao contexto global em mutação, até porque, por ter tanto poder quer para o bem, quer para o mal, por ser a pedra angular do sistema ocidental de alianças e o centro da economia global actual, aquilo que faz, e o que não faz, é muito mais importante do que aquilo que qualquer das outras potências decide fazer.
Agora é esperar para vermos o que nos aguarda.
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