segunda-feira, 30 de junho de 2008

A xícara da Dona Maria

Era muito elegante, de fina porcelana branca, e eu senti-me muito honrada quando, logo na Primeira Classe- foi minha professora durante toda a Primária-, fui escolhida para, todos os dias, por volta das dez horas. a levar à Deolindinha, a empregada da Escola, para que nela vertesse o chá preto que a D. Maria havia de tomar.
No fim, levava-a para que fosse lavada, e, então , guardava-a, dentro de um saco de papel, no armário, onde no dia seguinte, à mesma hora, a iria buscar, para que se repetisse o ritual...

O ouro, sempre o ouro!


Não se trata de paranóia, nem de uma recôndita mania da perseguição, mas apenas de uma manifesta estranheza perante indícios que se vão paulatina, mas inexoravelmente acumulando.

Ontem à noite, no rescaldo da merecida vitória da selecção espanhola, foi já  sem surpresa que ouvi um arauto dos comezinhos  fait-divers semanais do regime - onde a efabulação, as meias palavras e a instilação de veneno são banais -, perorar babadamente acerca de imaginárias ilações políticas a retirar do espectáculo oferecido no estádio do Prater vienense.  Referia-se - arvorando o seu melhor e pepsodêntico alvar sorriso -, à constante presença da família real espanhola no camarote de honra e às naturalissímas quebras de protocolo de Suas Majestades João Carlos e Sofia, indicando a unidade do país para o que de pior  ou melhor pudesse acontecer. Inacreditável. A sumidade mostrava-se falsamente surpreendida pela forma como os monarcas desempenhavam as suas normais obrigações de Estado. Como se tal trivialidade fosse de espantar.

Esta gente, além de desleal - como certos e recentes acontecimentos comprovam à saciedade - é parva. O constante rastejar, a maquinação de ver coisas onde elas não existem, o vale tudo interno e o embevecimento pelo que lá fora vislumbram, começam verdadeiramente a enojar. Nojo pelo calculismo quiçá propiciador de benesses, nojo pela ignorância manifestada - e naquele caso imperdoável - e principalmente, nojo pelo situacionismo que dentro de Portugal pétreamente mantêm. Tudo isto é vergonhoso. Aquilo que lhes exalta o espírito no país vizinho, aqui desdenham e menorizam. Se em Lisboa estão cinicamente presentes em  eventos onde a família real os honra pelo simples convite, logo a seguir apresentam diante dos noticiários da hora do jantar, o habitual rictus faciallis  que infalivelmente se conota com o repúdio, dúbia mofa e a supina cretinice de certezas adquiridas pela cobiça ou preconceito. Estão simultaneamente em todas as situações e em nenhuma, vestindo a casaca mais conveniente às suas extemporâneas ambições.

Dias há em que parece vivermos em 1908, para vinte e quatro horas depois, remetermos as nossas existências a 1580, onde uma dúzia de oportunistas aguarda a colheita do fruto das suas actividades dissolventes e de comprometimento com interesses além-fronteira.

O ouro, sempre o ouro!

Estou farto desta ralé engravatada.

Não há quem os cale?

domingo, 29 de junho de 2008

«Les moins de vingt ans ne peuvent pas connaitre»


Ainda o Rio Lima

Situado pelos antigos nos Campos Elísios, dada a luxúria da envolvência natural, que fazia daquela uma região habitada pelos bem aventurados, queridos dos deuses, foi identificado pelos romanos como o rio do esquecimento, pois que o ver tanta beleza fazia com que qualquer ser humano esquecesse tudo o mais, até na História Natural de Plínio, o Moço, do que o mesmo Diogo Bernardes faz eco, quando escreve

«Junto ao Lima claro e fresco rio,
Que Lethes se chamou antigamente»


Foi cantado por outros poetas, como António Feijó, também ele ali nascido :
«Nasci à beira do rio Lima,
Rio saudoso, todo cristal.
Daí a angústia que me vitima,
Daí deriva todo o meu mal.

É que nas terras que tenho visto,
Por toda a parte onde andei,
Nunca achei nada mais imprevisto,
Terra mais linda nunca encontrei.

São águas claras sempre cantando,
Verdes colinas, alvor de areia,
Brancas ermidas, fontes chorando,
Na tremulina da lua cheia.»

Vejam até onde "isto" está a chegar!


Por terras do "Poeta do Lima"

Este ano ainda não se proporcionou, mas, por estas alturas, ainda no começo do Verão, não dispenso uma visita a Ponte da Barca, onde sempre passo um dia perfeito, nas margens daquele que foi a gande inspiração do nosso poeta quinhentista, que privou, entre outros, com Sá de Miranda e António Ferreira: o poeta da Ribeira-Lima, Diogo Bernardes.

Inserindo-se numa escola mais vasta, da qual ressalta o nome de Petrarca, o autor de «Várias Rimas ao Bom Jesus», «Rimas Várias- Flores do Lima» e «O Lima», exprimiu o seu sentir poético em éclogas, sonetos, cartas e canções, de sabor bem ao seu tempo- o do Homem do Renascimento.
Dele, que fora feito prisioneiro em Alcácer-Quibir, aonde acompanhara D. Sebastião, diz-se no Dicionário de Literatura:«A melancolia doce da paisagem minhota sentiu-a como poucos no seu tempo esse cantor dos rios. Poeta do Lima se lhe chama geralmente, porque, sendo natural e vivendo muito tempo na ribeira do Lima, cantou particularmente aquele rio.Mas não foi só o Lima.(...) O Tejo, o Douro, o Mondego, o Leça, o Vez...(...) O que porventura melhor distingue Bernardes é a melancolia vaga e doce, um pouco à Bernardim(...); a profunda religiosidade que o aproxima às vezes do poeta seu irmão Frei Agostinho da Cruz».

Para a Cristina

E com votos de bom fim de semana para todos:


sábado, 28 de junho de 2008

Mais coincidências

Ontem, tarde já, ao ver num livro de pintura este quadro de Magritte, veio-me à ideia o muito lembrado e caríssimo Je Maintiendrai, pois que me lembrei de um post, sobre um anúncio do Martini, em que dizia que era para ele, porque merecia.
É que também eu pensei oferecer-me um concerto de violino, de preferência Bach, "porque merecia", e lembrei-me de que, algures na confusão de CDs tinha um Oistrakh- não me recordava quais eram, ao certo, os compositores que tocava-, mas já era tarde para o procurar e adiei a busca para esta manhã.

Hoje, ainda antes de iniciar a demanda, comecei a visitar os blogues de sempre, e foi grande a alegria quando vi que O Jansenista tinha a tocar um concerto para dois violinos, de Bach, sendo um dos executantes o mesmo Oistrakh; tanto mais, quanto vim depois a constatar que o meu não integrava Bach...
Pois, pensei, a blogosfera também pode ser um ponto de encontro de pensamentos.

A Verdade da História. 2. Fachoda: Ultimatum britânico à França (1898)


A tentativa francesa de criação de um império colonial teve início no século XVI, quando uma expedição fundou a França Antártica (Rio de Janeiro, 1555) e mais tarde, a França Equinocial (Maranhão, 1612). A resposta portuguesa frustraria estes planos de estabelecimento na América e assim, a par das guerras pela hegemonia na Europa, os franceses foram conseguindo ao longo de todo o século XVII, fundar entrepostos comerciais na costa hindustânica e na zona compreendida entre a Birmânia e a China. Desta forma, os emissários de Luís XIV ganharam uma desmedida preponderância no Sião, até uma violenta reacção local eliminar quaisquer veleidades em transformar o reino numa colónia. Na Índia, o inicial ímpeto de conquista esboroou-se com a derrota na Guerra dos Sete Anos que conduziu à perda de todos os territórios no subcontinente - com a excepção daquilo a que Paris passou a designar de  comptoirs que se manteriam até à independência da U.I. em 1947 - e principalmente, à eliminação e conquista inglesa da importante colónia do Quebec. Desta forma, no primeiros momentos do império de Bonaparte, a França possuía uma presença residual nas Caraíbas e na costa indiana, além de alguns arquipélagos no Índico. Perdidas as ilusões de unificação europeia sob a égide do Grande Corso, a Restauração dos Bourbon procurou aproveitar o despertar do nacionalismo, encetando uma política de controle da margem sul do Mediterrâneo, onde pequenos Estados vagamente dependentes da Sublime Porta, exerciam sobretudo actividades corsárias, criando uma permanente perturbação e insegurança à navegação e comércio. O governo de Carlos X faz desembarcar uma expedição militar em solo argelino (Sidi-Ferruch, Junho de 1830), tomando Argel em Junho. Foi este o marco que deu início à edificação do importante conjunto territorial, espalhado por três continentes e que durante cerca de sete décadas foi conhecido como Império Colonial Francês.

A derrota do Império de Napoleão III frente aos contingentes alemães (1870-71), consistiu talvez, no principal factor do momentâneo reconhecimento da perda da luta pela hegemonia na Europa, consumadas as unificações da Itália (1860-70) e da Alemanha. Paris considera, finalmente, a imperiosa necessidade de participar num sistema de alianças que garantisse a segurança face ao poderoso II Reich e contando com a contemporização de Bismarck - que pretendia afastar os franceses dos assuntos europeus -, reentra na cena política internacional, participando na partilha do mundo em esferas de influência. Nos finais do século XIX, a França contava já com uma posição preponderante no Magrebe (Argélia em 1830 e Tunísia em 1881) e iniciava a disputa pelo controle do império xerifino de Marrocos, situação esta resolvida com a Alemanha após o episódio de Agadir (1911).

A  subordinação da vasta zona semidesértica da África Central (década de 80) e a conquista da grande ilha de Madagáscar, avolumaram as tensões com os ingleses que viam chegar um inesperado concorrente à posse do vital e estratégico continente africano, quando já tinham ocorrido litígios devido à ocupação do VietnameLaos e Camboja (a Indochina Francesa). Paralelamente à política expansionista ditada pelos interesses económicos e pela situação de impasse criada na Europa, as derradeiras décadas de oitocentos assistiram à proliferação de numerosas sociedades de exploração de territórios que baseando-se formalmente no desejo de alargamento científico de conhecimento do planeta, estabeleciam também as suas actividades, em alegadas intenções civilizacionais e de conversão religiosa.  Deste modo, os debates entre potências europeias, passaram a centrar-se sobre reivindicações territoriais fora do continente, onde a França conseguiu a colaboração de Bismarck, o incontestável condutor da política de equilíbrio continental. A doutrina do Chanceler de Ferro indicava a Europa como centro do poder mundial e assim, esta secundarização da luta pela obtenção de colónias, condenou os alemães à posse de territórios de escasso valor económico (CamarõesTogolândiaSudoeste Africano e o arquipélago das Marianas, no Pacífico). Apenas o Tanganica (com o Ruanda e o Burundi) possuía alguma relevância, mas encontrava-se delimitado pelos portugueses (Moçambique), belgas (Congo) e ingleses (Quénia e Uganda). O Congresso de Berlim (1878) estabelecera os novos parâmetros necessários para o reconhecimento da soberania, implicando a efectiva delimitação, ocupação e reconhecimento internacional dos territórios reivindicados. 

Ao longo de duas décadas, os franceses foram avançando e submetendo os territórios que do Senegal e em direcção a leste, vão abrindo o caminho em direcção ao Alto Nilo, o que inevitavelmente unificaria todas as possessões coloniais situadas entre o Atlântico e o Mar Vermelho (Djibuti). Este movimento forçaria a intersecção com os ingleses que estabelecidos no Egipto, iniciavam a penetração em direcção à África Central, subindo o curso do Nilo. Sendo o Egipto um Estado formalmente independente mas incluído na esfera de influência do Império Britânico, o Sudão surgia como um território fulcro dessa expansão em direcção ao Lago Vitória, pretendendo Londres unificar toda a zona compreendida entre o delta (Alexandria) e o Tanganica alemão (EgiptoSudãoQuénia eUganda). O conflito com as repúblicas boéres na África do Sul, colocou os britânicos numa situação de possível conflito com as outras grandes potências europeias com quem tinha disputas territoriais. Assim, os interesses ingleses colidiam com a Rússia no Afeganistão e com a FrançaPortugal e Alemanha em África. Resolvida a questão portuguesa com o Ultimatum de 1890 - ditando o reconhecimento da posse britânica das Rodésias e do Niassalândia -, o principal obstáculo à política de criação de um eixo entre o Cabo e o Cairo, tornava-se assim, nas expedições enviadas pela França ás zonas limítrofes do Alto Nilo.

Em 1895, o jovem capitão Marchand concebe o plano de atravessar a África , com o fim de instalar a presença francesa na região do Alto Nilo, impedindo os ingleses de realizar o sonho britânico da ligação do seu domínio sul-africano, ao protectorado egípcio. Em França, existia uma opinião discordante da política prosseguida e que tinha conduzido ao domínio do Egipto por Londres. Desde os tempos da campanha de Napoleão, a terra dos faraós era considerada por muitos, como uma parte importante da política externa francesa e a abertura do Canal de Suez por Lesseps, mais enraizou a certeza de um infalível resvalar do país para a órbita do império colonial francês. No entanto, em 1882 os ingleses instalam-se formalmente no Egipto e iniciam a subida do Nilo em direcção a sul, deparando com grandes dificuldades criadas por um auto-proclamado profeta iluminado, conhecido pelo Mahdi, que conseguiria derrotar expedições britânicas, matar o general Gordon, capturar Cartum (1885) e estender a insurreição a todo o vale do Nilo, ameaçando arruinar o Egipto, desviando as suas águas. A França  decide aproveitar a situação e o comissário-geral no CongoSavorgnan Brazza,  encarregou Liotard da conquista de todos os territórios a este de Ubangui, abrindo o Nilo à ocupação francesa. O chefe do governo britânico, lord Salisbury, convoca então o representante francês em Londres, informando-o da decisão inglesa em conquistar o Sudão, obrigando Paris a reagir e a organizar rapidamente uma expedição que teria Fachoda como destino. Em 1896 Marchand desembarca no Congo francês e após um inegável esforço moral e físico, consegue chegar ao Alto Nilo em 1898, vencendo todo o tipo de adversidades, numa epopeia que exaltou os sectores ardentemente nacionalistas, que numa França que vivera as incertezas populistas do Boulangismo e que se encontrava mergulhada no caso Dreyfus, tinha uma imperiosa necessidade de galvanizar as massas, unificando-as em torno do instável regime da III república. Em 10 de Julho de 1898, a expedição Marchand chega a Fachoda, após uma penosa marcha de 5000 quilómetros. O capitão toma posse da localidade em 12 de Julho, declarando-a território francês e hasteando a tricolor junto nas margens do Nilo. Ordenou que fosse construído um forte e procurou que o chefe da tribo local dos Chiluques assinasse um tratado de reconhecimento da soberania francesa. Em plena crise mahdista, o entreposto foi atacado em 25 de Agosto, conseguindo os franceses repelir a investida. Quatro dias depois, impressionado pela derrota infligida aos mahdistas, o sultão chiluque coloca formalmente o seu povo sob a protecção francesa. A conquista do Alto Nilo parecia um facto consumado, delirantemente celebrado em toda a França. Não se tratava de uma mera reivindicação como aquela anunciada pelos portugueses com o Mapa Cor de Rosa, mas de uma efectiva exploração, conquista e proclamação de soberania.

Em 19 de Setembro, Marchand recebe uma carta de Herbert Kitchener, anunciando-lhe a decisiva vitória inglesa em Omdurman, a prisão do emir Said Sagheir e a liquidação do poder derviche no Sudão, escapando o Mahdi, abandonado pelos seus partidários. Nesse mesmo dia, surge o navio que conduzia o general inglês, acompanhado por  quatro canhoneiras que rebocavam barcaças carregadas com 2000 soldados e cinquenta peças de artilharia. Kitchener declara que a presença de Marchand em terras pertencentes ao Quediva do Egipto, pode acarretar uma guerra entre a França e a Inglaterra, mas o capitão francês responde ter ordens do governo para ali se manter
Num momento em que a perturbação política leva à sucessiva mudança de governos em Paris, torna-se improvável uma firme resposta francesa, pelo que Kitchener decide aguardar os acontecimentos, evitando o conflito imediato e dando oportunidade às consequentes manobras diplomáticas.  Limita-se então a declarar o bloqueio  da guarnição francesa, interditando o acesso  de munições e armas. Dependente da opinião pública, o governo francês condecora Marchand em 9 de Outubro, promove-o a major, ao mesmo tempo  que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Delcassé, já perdera todas as esperanças na resolução do conflito a favor dos interesses da França, pois a  presença de Marchand em Fachoda, significava claramente a guerra com a Inglaterra.  O enviado do major, o capitão Baratier, tentou contactar os "patriotas" e promover uma campanha de fervor nacionalista, conseguindo as assinaturas de cem deputados, para uma petição que repudiava o recuo do governo.  Naquele preciso momento, os ânimos estavam exaltados ao rubro em ambos os lados da Mancha e o Chanceler do Tesouro, Sir Michael Hicks, chega a declarar que ..." seria uma calamidade que depois de uma paz de oitenta anos, nos envolvêssemos numa grande guerra. Mas há males piores que a guerra". Na verdade,  os patriotas que empunhavam a tricolor nas praças, julgavam que a simples manifestação de repúdio levaria a Inglaterra a contemporizar. Assim, o predecessor de Delcassé, dizia que ..."a este povo repugna o sacrifício. Uma só palavra de guerra ou conflito assusta-o. Quer, sem riscos, ser o primeiro em tudo". Simultaneamente, o presidente Félix Faure escrevia: "temos actuados como doidos em África, arrastados por esses irrrsponsáveis que se chamam os coloniais". As febris consultas às restantes grandes potências, demonstram à evidência, o isolamento da França, esquivando-se a Rússia e a Tríplice Aliança (AlemanhaÁustria-Hungria e Itália) à possibilidade de um conflito com a Grã-Bretanha, a incontestável senhora dos mares.

Enquanto isso, a rainha Vitória - tal como fizera em 1890 quando do Ultimatum Portugal - declara aos seus ministros que  ..."a guerra não é concebível por um pequeno motivo. Os franceses foram apanhados num terrível beco sem saída. É preciso ajudá-los a sair dele".
A consequência da firmeza britânica, impeliu o governo francês a invocar um mero pretexto - pouco convincente para a opinião pública - de ordem sanitária, para a retirada da missão Marchand. Urgia repatriar a expedição e assim, Delcassé anuncia em 3 de Novembro: "em presença do estado sanitário da missão Marchand, o governo acaba de decidir que abandonará Fachoda". Poucas semanas decorridas, a bandeira francesa era definitivamente arriada no Nilo.

O que torna este episódio relevante para os portugueses, é o facto de uma considerada grande potência - a França, possuidora do segundo exército e da ainda segunda marinha do mundo e modelo de todas as "virtudes republicanas" almejadas pelos seus seguidores do p.r.p. -, ter cedido sem combate. Imitando as manifestações de oito anos antes nas ruas de LisboaParis indignou-se, mas cedeu. A única diferença, consiste no simples facto de Fachoda ter cumprido todos os requisitos exigidos pelo Congresso de Berlim. Território explorado, ocupado e formalmente anexado, parecia inevitável a sua posse pela França. Na realidade, o Ultimatum britânico a Paris, foi infinitamente mais humilhante que aquele enviado a Lisboa. No entanto, a grande lição a tirar do episódio, consiste na ausência de um total aproveitamento populista pelos minoritários partidários da destruição do regime. Em Portugal vingou a demagogia que seria aliás, apanágio e razão de ser da república de 1910.

Hoje é véspera do dia

de São Pedro, o terceiro dos Santos Populares, e o que se festeja na vila que me é geograficamente próxima, e onde nasci.
Dos dez/onze anos até ao fim da adolescência, não falhei uma única noitada- muito mais calma, sem martelos de plástico, nunca fui calcada como daquela vez quando fui ao São João de Braga.
Nessa altura, como gostava de andar no carrossel e nos "carrinhos eléctricos"...

E se é certo que o Santo não tem a fama de "casamenteiro", que é a de Santo Antóonio, nem a de "advogado do amor", de São João, patrocinou o namoro dos meus pais: foi só o tempo para o meu pai pedir à minha avó materna que deixasse "a rapariga ir divertir-se".
Deixaram a festa já namorados...

A segurança do PM ou a tentativa falhada de um assassinato à americana

De facto, como escreve o João Villalobos, não se pode brincar com a segurança do PM, ainda assim, não posso deixar de achar uma certa ironia, não tanto porque seja uma eventual tentativa falhada de ter um assassinato à la Kennedy, longe de o ser, à partida, pelo ridículo da própria situação, mas porque com a crescente instabilidade social (que há uns meses uns senhores já vinham adivinhando), parece que estamos a regressar ao tempo em que o factor rua dominava a política nacional. Ah esse maravilhoso povo de brandos costumes...

Ainda os feminismos

Plenamente de acordo

Se, numa sociedade, os melhores de entre os melhores abdicam de liderar, não resta ninguém para o fazer. Todos os outros já estão há muito tempo do lado dos que protestam, dos que esperam que alguém, lá em cima, no topo da hierarquia, faça alguma coisa. Se as elites não estudam os problemas, não criam as soluções e não lideram a mudança, mais ninguém o poderá fazer. Um país em que as elites protestam, reivindicam, pedincham, exigem, vai ser liderado por quem? Se todos pedem, quem dá? Se os melhores entre os melhores não assumem a responsabilidade pelo seu destino, se esperam que alguém lá no topo os dirija e lhes resolva os problemas, quem é que devemos colocar no topo?

Tenho plena consciência de que esta crónica é incompreensível. Fala de duas ideias estranhas. Fala de elites e da responsabilização das elites. O membro de uma elite é alguém que, pelas suas qualidades, se eleva acima dos outros. Numa democracia, a elite é inaceitável. Somos todos iguais. Protestamos todos, em igualdade. A ideia da responsabilização das elites é ainda mais estranha. Ninguém quer responsabilidades. Todos exigem direitos.

João Miranda in DN - O estado das Elites

Tão bonitos que eles são


sexta-feira, 27 de junho de 2008

Só porque faz um desenho bonito,

é que esta Eva a colher o fruto proibido aparece no livro antigo que hoje encontrei.

Não pode ter ligação nenhuma com este título recente,,,

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Coisas realmente importantes por esta altura

Do estudo de Direito Internacional Público, o que mais gostei foi aprender termos em latim que se prestam a impressionar qualquer miúda: res nullius, res communis, actio popularis, ius cogens, sua sponte, ex aequo et bono, erga omnes, ipso facto, restitio in integrum...ou então não... vou mas é ler tudo outra vez!

Mas também oiço Vinícius de Moraes

"Porque a vida só se dá pra quem se deu
Pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu
Ah, quem nunca curtiu uma paixão, nunca vai ter nada, não"

Ouvindo Tom Jobim e Charles Aznavour.

«Porque o amor é a coisa mais triste, quando se desfaz»

«...au temps des amours mortes»

Parabéns, Fontela!

Coincidências

Hoje além de ser o dia que celebro o meu aniversário é também a data que se recorda a morte do Imperador Romano Juliano – faz hoje 1645 anos. Como me parece uma grande personagem da nossa história Ocidental prefiro usar este espaço para o relembrar.

Favius Claudius Iulianus nasce em Junho de 322 E.C. em Constantinopla, filho do meio irmão do Imperador Constantino (o mesmo que insidiosamente inseriu o Cristianismo no coração do Império) nunca se pensou que a púrpura imperial estivesse no seu destino, mas dadas as reviravoltas da política bizantina só o facto de ter sangue de tal família tornava esse facto uma possibilidade não desconsiderável. Em 337 E.C. Constâncio II (filho de Constantino e um Cristão Ariano devoto) lidera o massacre da família de Juliano num esforço de eliminar rivais à sucessão. Depois de assassinar todos os elementos masculinos de idade da família Constâncio manda prender Juliano e o seu irmão Gallus que são assim educados segundo o Cristianismo Ariano que mais tarde viria a rejeitar em beneficio do paganismo helénico com grandes influências neo-platónicas (mais correctamente era teurgia). Acabou por ser nomeado César do Ocidente em 355 E.C. (no sistema da tetrarquia em vigor na altura existiam dois governantes imperiais seniores, os Augustos, e dois Juniores, os Césares) devido aos conflitos com os persas que necessitavam da atenção Imperial e a sua carreira foi de tal forma fulgurante que ao fim de poucos anos Constâncio já planeava uma forma de ser ver livre dele. Sabia que as tropas Ocidentais eram leiais a Juliano (quanto mais não fosse porque antes tinham sido exploradas e abusadas e Juliano tinha restaurado a sua eficiência e orgulho) e como tal tentou afastá-las to caminho emitindo um édito requisitando as suas tropas para a frente oriental. As tropas revoltaram-se e em Fevereiro de 360 proclamaram Juliano Imperador em Paris. Antes que tudo pudesse passar a uma guerra civil Constâncio II teve a decência de morrer e nomear Juliano como herdeiro no seu testamento.

Ao subir ao trono Juliano rescindiu a tetrarquia de Dioclesiano instaurando um sistema imperial unificado, restaurou a liberdade religiosa quer para pagãos (ao reabrir os templos fechados pelos Cristãos) quer para Cristãos (permitindo que as vozes dissidentes pudessem regressar sem medo do exílio), restaurou a autonomia cívica (permitindo maior liberdade de acção às cidades), restaurou a credibilidade do poder imperial (todo o séquito acumulado pelos imperadores que o precederam em Constantinopla foi dispensado e as a administração voltou a estar nas mãos de um Imperador em vez de eunucos), proporcionou justiça para os que tinha sido abusados (obrigou a Igreja a indemnizar os cultos e templos pagãos que tinham sido destruídos ou que tinham visto a sua propriedade confiscada) e finalmente ele próprio se assumiu com pagão agora que não temia a retribuição da facção Cristã na capital. O seu reinado começou com os melhores presságios, esperava-se um novo Marco Aurélio, uma época de ouro e assim poderia ter sido se pouco depois da sua ascensão não tivesse liderado pessoalmente um expedição desastrosa contra o Império Persa sendo que a 26 de Junho de 363 E.C. morreu vítima de uma lança. Após este triste incidente Joviano, um soldado, foi eleito Imperador e eventualmente iria restaurar as brutais políticas cristãs que tinham sido prática corrente antes de Juliano.
Foi um breve reinado mas cheio de esperança. Para todos os que ambicionavam a reforma do Império, a estabilidade, a Justiça e o retorno ao clássico foi um período de promessas, de um futuro de ouro que estava ao seu alcance se tivessem tempo de o implementar. Não tiveram. Juliano seria o último imperador a dinamizar o Ocidente, o último a reinar como pagão, o último rei-filósofo, o último Imperador a ser iniciado nos mistérios de Elêusis. Foi-lhe dado o cognome de “o apóstata” mas teria sido mais apropriado ser considerado “o restaurador”.

No Combustões


A democracia por que clama a mole de manifestantes é a da soberania do povo, moderada pela soberania real. Nesta multidão não há as "forças fáticas" do aparelho burocrático e dos interesses instalados. Os interesses instalados - o poder do dinheiro, da banca, do imobiliário e da especulação - invocam a legitimidade do governo. Coisa estranha esta a do dinheiro querer falar em nome do povo, sobretudo daquele povo pobre e ignorante que da plutocracia jamais mereceu qualquer movimento de solidariedade. A única força que neste país deu dignidade ao povo chão, que a ele se consagrou, lhe deu escolas, hospitais, formação profissional, dignidade e patriotismo foi o rei, que desde há 50 anos é o baluarte dos direitos dos pequenos. É para ele que se voltam os tailandeses para, uma vez mais, restaurarem a união que, no passado, foi o instrumento da paz e da unidade.

Para as feministas, defensores(as) de quotas e afins

Os méritos de um ser humano, e de um ser humano cidadão, em particular, não devem continuar a depender de uma classificação na base do sexo. Nenhuma mulher corre hoje o risco de chegar a uma qualquer universidade, por exemplo, e perguntarem-lhe se não estará equivocada. Um imbecil será sempre um imbecil independentemente de ser homem, mulher ou hermafrodita. O associativismo sexista, para além de elitista, destina-se supostamente a discutir e a impor "especialidades". Não imagino nenhuma mulher da Quinta do Cabrinha ou da Cova da Moura a ser "convidada" a apresentar uma comunicação ao congresso. As participantes - e os participantes - viveram sempre a "humilhação", nas suas cabecinhas pequeno-burguesas, como um fenómeno puramente intelectual.

João Gonçalves in Portugal dos Pequeninos

Croniquetas republicanas (8): república vista pelos republicanos


"Na noite de 19 foram assassinados em Lisboa, o António Granjo, presidente do conselho, o Machado dos Santos, o Carlos da Maia e outros. O Manuel Coelho preside a um governo, de quem ninguem quer fazer parte. O António José d' Almeida fala em ir-se embora. Os partidos desappareceram. Os chefes, como o António Maria da Silva, a quem tambem quizeram matar, andam escondidos. Em Lisboa, estão trez barcos de guerra e já o corpo diplomatico esboçou o primeiro gesto de uma intervenção, fazendo votos, numa nota ao governo, por que os criminosos sejam punidos. Se aquillo não pára, é como acaba: pela intervenção."

João Chagas, Diário, entrada de 30 de Outubro  de 1921 (Paris)

"O Almeida fica. As enormidades, as tolices, os desconchavos que este homem tem dito e escripto! Ninguem no entanto parece dar por isso, pois o seu prestigio cresce! O antigo tribuno da plebe, como elle proprio se intitulava, pede ordem. A ninguem no entanto occorre que elle foi um dos maiores fautores de anarchisação da republica. Ás suas manobras subterraneas, ás suas carbonarias, aos seus pamphletos, aos seus jornaes aggresivos, á sua occa phraseologia revolucionaria deve ella o estado em que se encontra, a braços com o povo que elle desencadeou".

João Chagas, Diário, entrada de 4 de Novembro de 1921 (Paris)

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Só uma sugestão

Se os portugueses pouco se interessam por política, menos ainda a percebem, o que se constata pelos níveis de abstenção a rondar os 40% nas diversas eleições/referendos, e tendo em consideração a febre pelo futebol que faz parar um país quando a selecção joga, não seria lógico que pudéssemos todos votar para escolher o seleccionador nacional, em vez de mandatar alguém? Sei lá, apresentavam-se umas candidaturas pessoais, como para as presidenciais, com apoios e lobbies e tudo...

A poucos quilómetros de Castelo Rodrigo,

encontrámos o Convento de Santa Maria de Aguiar, que integra no seu conjunto uma Igreja muito bem preservada, evidenciando a austeridade quer da Ordem Beneditina, à qual começou por pertencer, quer da Ordem de Cister, onde se incluiu depois.

Muito perto deste convento, deparámos com um bonito edifício, com colunas de pedra, evidenciando-se o brasão com as armas da Ordem fundada por S. Bernardo de Claraval, onde se hospedavam os peregrinos que aí acorriam...

No Combustões

Há cento e cinco anos (2)

Querida Cristina, pegando na efeméride que nos traz, lembro os 5 posts que escrevi há 2 meses: "Relembrar Orwell" - 1, 2, 3, 4 e 5.

Há cento e cinco anos

nascia na Grã-Bretanha (Índia Britânica, concretamente) aquele que seria um escritor com uma visão muito certeira do que nos estava reservado para o futuro, que é afinal o nosso presente: George Orwell.

Carrancas do desTratado de Lisboa

Ora toma lá mais esta!

Carrancas do desTratado de Lisboa

A imagem que o Nuno

postou aí em baixo lembra-me um trecho de um poema" a velhinha atrás, o jumentinho adiante" (mas vão tão perto um do outro que melhor seria dizer: "são farinha do mesmo saco" )...

terça-feira, 24 de junho de 2008

O Congresso dos Social-Burocratas


Terminou o quinquagésimo quinto Congresso do Partido Social Burocrata. Numa sala a abarrotar de convivas e personalidades de relevo mundial, durante dois dias debateram-se os grandes princípios orientadores da nova arrancada regeneradora da Nação. Surgiram propostas muito concretas no campo da economia, das finanças, da saúde, política externa e das obras públicas. Brilhou - tal clarão de alvorada - uma ideia rutilante de conteúdo que salvará o Tratado de Lisboa e com ele, o porvir de quatrocentos milhões de almas sem rumo. Foi um geral pasmar pela apresentação de princípios e de soluções que ninguém adivinhara e o palco foi pequeno, ínfimo até, para a multidão de insuspeitados génios que quiseram gritar bem alto presente!, nesta afirmação de Fé num PortugAll pequenino que com eles se tornará ainda maior. Uma mensagem especial foi enviada pelo Presidente da Colisão Europeia, Dr. Mulão Lamoso agradecendo o transcendente acto de afirmação nacional.
Além da bisneta de um antigo primeiro ministro da Monarquia (presidente), todos os sectores de actividade foram contemplados com lugares decisivos para a construção da vitória que se avizinha. Assim,  foi eleito o senhor Beto Paçô Lebre, sumidade causídica de renome mundial; o senhor Acácio Bardalhéu Tremelas, presidente da Câmara de Afoitelas de Baixo; o doutor Marcellino Rabbelo Sousell, conhecido comentador e técnico da área do desporto; o senhor Nuno Mural Cimento, antiga glória do pugilismo nacional; a menina Cátia Neuza Pacheco-Peixotto, secretária extra-curricular de antigos ministros; o senhor doutor engenheiro Patada Atum, da área da construção; a menina Vanessa Inge d'Oliveira Silva Arschberg, em representação das comunidades portuguesas na Europa; o dr. Arcanjo Corrente, perito em Polícia e Assuntos Muçulmanos; em representação das comunidades estrangeiras em PortugAll, a menina Suely Dulcinele de Galera Acinco e a ex-camarada Zica Sousescu Seabrov; o senhor Belarmin Félix d'Orel Gaulois und Arschberg (marido da menina Vanessa), empresário da noite de Paris St. Denis; a senhora Felismina  de Bohrrah-Botta Touril, estilista da área dos têxteis; o doutor Miguel Capim, do grupo parlamentar; a senhora Ruth Ritta Rotha Rholão, esteticista;  o doutor Rui Riacho, autarca; o doutor António Borgas, uma futura promessa primo-ministeriável; o doutor Saltana Lápis, deputado pelo círculo de Montanelas.
A nova presidente proferiu o discurso de encerramento, no qual procedeu à análise da actual situação nacional, anunciando circunstanciadamente o projecto do Partido da beringela para todas as áreas da governação, tornando-se assim muito claras, as diferenças que o separam do actual governo no poder (no telejornal das 8.00H, foi patente o incómodo do Dr. Eng. Arquitecto Platónyos, procurando rebater a avalanche de questões colocadas pelos pivot).
Os congressistas indicaram um prazo de quatro meses para a apresentação do programa de governo, que deverá ser solenemente anunciado no próximo 5 de Outubro, 98º aniversário da jovem república.

Vivó São João

Ó S. João d'onde vindes
Pela calma, sem chapeu.
Venho de ver as fogueiras
Que me acenderam no ceu

Mas acendem-lh'as cá na terra egualmente! Ou ellas não servissem para queimar as alcachofras, onde as raparigas vêem a sorte dos seus amores! Santos mais milagrosos poderá haver; mais populares não, que elle é a personificação mythica da alegria, e o advogado do amor."
«O Minho Pittoresco»

Agradecer

A João Marchante, do blogue Eternas Saudades do Futuro, a referência...

Do Sentido de Estado

(imagem tirada daqui)

Porque também nutro uma especial admiração de teor académico pelo homem do século XX português, quero notar aquilo que escrevia em 1936/37 no ensaio "Como se reergue um Estado" (ed. Esfera do Caos). Se paralelismos podem ser traçados entre o sistema do rotativismo monárquico do século XIX e o que se revela hoje em dia, é também de notar a forma precisa como Salazar diagnostica algo que tem levado à decadência dos regimes políticos em Portugal, tão presente na I República como talvez na actual III. Tirem as ilações que quiserem:

A seriedade é, em primeiro lugar, a conformidade dos sentimentos com as ideias e a conformidade dos actos com os princípios. Tanto na vida pública como na vida privada, a falta de sinceridade desmoraliza e cansa: nenhum regime político que emprega a mentira como método de governação ou que se contenta com verdades convencionais pode ter crédito na alma popular.

Para nós, não há falsas acusações como arma política, nem factos para além daqueles que foram controlados, nem promessas que não sejam a antecipação de um desígnio amadurecido ou de um plano realizado com segurança.


Se somos contra os abusos, as injustiças, as irregularidades da administração, o favoritismo, a desordem, a imoralidade, é porque isso corresponde a uma ideia séria de governação e não a uma atitude política, à sombra da qual cometemos os mesmos abusos e as mesmas injustiças.


(...)


A gravidade da vida não implica necessariamente o luto da tristeza, o pessimismo, o desencorajamento; ela é, pelo contrário, muito compatível com a alegria do povo, as brincadeiras, a graça e o riso. Exige simplesmente que as coisas sérias sejam seriamente tratadas. Eis porque é que as pequenas conspirações de passeata, os planos dos revolucionários desempregados, os projectos que trarão felicidade e abundância apenas porque são publicados no Boletim Oficial, os gabinetes de amigos, as combinações de nepotismo, a distribuição de lugares e a criação do caos de onde sairão depois, espontaneamente, a ordem e a luz, deixam de lado as profundas realidades nacionais e não passam em geral de jogos infantis, de pequenas tragédias familiares, sob o olhar vigilante dos pais.

Portugal começou a "cumprir-se"

no dia 24 de Junho de 1128, com a vitória do Princípe D. Afonso na Batalha de São Mamede...

Com a morte do Conde D. Henrique, vinha crescendo a importância do fidalgo galego Fernando Peres junto da Condessa viúva, D. Teresa, o que punha em perigo as pretensões autonómicas de um alargado grupo de Cavaleiros do Condado, os quais transferiam agora as suas esperanças para o ainda muito novo D. Afonso Henriques, a quem urgiam neutralizasse aquela maléfica influência, pois que, como refere um ilustre vimaranense, Padre Torquato, «a brevidade com que se ataca os males é remédio deles».
Deste modo, no dia em que se honrava São João, aconteceu, em lugar incerto, mas nas imediações do Castelo, o recontro no qual, nas palavras do General Luíz Maria da Câmara Pires, se jogou "o destino de um povo, a batalha por Portugal"...
E se é certo que só meio século depois, "de trabalhos e proezas militares", como se lê na Bula "Manifestis Probatum", de 23 de Maio de 1179, Alexandre III confirmaria o novo reino e a realeza de D. Afonso, nada de mais verdadeiro do que considerarmos aquele como o primeiro dia de Portugal...

domingo, 22 de junho de 2008

Ainda na Beira Alta

Naquele fim-de-semana esticado, por via do Feriado do 1º de Dezembro, foram várias as aldeias históricas visitadas, mas a visita a Castelo Rodrigo foi a mais proveitosa...

Começámos por olhar as ruínas do palácio de Cristóvão de Moura, feito conde, e Senhor daquela terra por Filipe II, como paga da lealdade à coroa castelhana, mas que o povo, logo que soube da Restauração, na pessoa de D. João IV, destruíu quase totalmente, para, depois de percorrermos aquelas ruas solitárias que conduziam ao Castelo, mandado erigir por D. Dinis após a celebração do Tratado de Alcanizes, apreciarmos o monumento evocativo da Batalha de Salgadela, no ano de 1664, decisiva para a defesa de toda aquela região, e onde se destacou o governador militar da Beira, Pedro Jacques de Magalhães.

Perto da Igreja Matriz, admirámos o belíssimo Pelourinho manuelino, da altura em que D. Manuel I mandou reedificar as muralhas.

Mas, a partir do século XVIII, a aldeia iria perder a sua importância, a favor da vizinha Vila de Figueira...

sábado, 21 de junho de 2008

Sempre pelo São João

«Não me lembro de Erva-cidreira tão boa, como a deste ano!», disse a minha mãe, quando, há dias, a foi colher, para secar, e guardar as folhas que hão-de durar até ao próximo ano, quando, também pelas orvalhadas de Junho, se fizer nova apanha.
"Há-de ser feita antes do nascer do sol, senão amarga".
Muito cedo lhe foi inculcada a crença nas propriedades calmantes da planta, pelo que lembro, desde sempre, a grande "chocolateira" (era assim que a chamávamos, apesar de nunca ter sido usada para fazer chocolate, e era em barro) com a infusão quente, ao borralho, que tomávamos, invariavelmente, antes de deitar, com bolachas Maria. Era o melhor dos aconchegos...

Celebrações

Hoje muitos neo-pagãos celebram o solstício de Verão! No Wicca com o nome de Litha ( noutras religiões pagãs com outra designação ) celebra-se ritualmente a maturidade do Deus que atinge neste dia a sua potência máxima e começa o seu declínio – simbolizado através da união sexual fértil com a Deusa mas sem se limitar a esse contexto. É um dia de festa e o momento mais exuberante e vivo do ano em que se festeja a abundância e as possibilidades futuras.

Este dia 14 que passou (a data não foi assinalada antes por esquecimento meu) celebrava-se em Atenas na antiga Grécia (e os seguidores do Helenismos ainda o fazem ainda que não exactamente da mesma forma) a festa da Bufónia (o assassinato do boi) dedicada Zeus Polieu (Zeus protector da cidade) em que miticamente ao serem deixados alguns bolos de cevada a Zeus um boi teria tido a audácia de os comer; os atenienses gritaram blasfémia e um deles matou o touro com um machado. Percebendo imediatamente que agira mal o assassino foge deixando a cidade entregue às maldições de um Zeus furioso por terem sacrificado um animal que devia ter sido deixado em paz. Desesperados os atenienses enviam representantes a Delfos para falar com Apolo que lhes comunica que a única forma de restaurar a paz dos deuses é trazendo o assassino à justiça e ressuscitar o boi. Como o assassino há muito que havia fugido os atenienses julgaram o machado empunhado na morte do animal e condenaram o objecto (que passou a simbolizar a sua culpa colectiva) a ser atirado ao mar e na impossibilidade de ressuscitar o boi embalsamaram o animal de forma a simbolizar o seu retorno à vida. E foi assim que se passou todos os anos durante séculos.

Coisas do Bairro das Colónias

Para desanuviar do estudo fui até um café. Enquanto bebi um café e três panachés vi uma série de agradáveis beldades desconhecidas a passearem-se por aqui, o que só me leva a tirar uma conclusão: passo demasiado tempo em casa, quer em tempo de estudar ou não...

Responsabilidade Internacional dos Estados, siga...

Carrancas do desTratado de Lisboa

A Verdade da História. 1. O Ultimatum de 1890. 2. O Ultimatum à França (Fachoda).


Um dos temas recorrentes dos detractores da Monarquia Constitucional, é invariavelmente, o chamado Ultimatum de britânico de 1890. Apresentam a resolução do conflito como uma inadmissível cedência perante a prepotência da Pérfida Albion, não procurando uma explicação para a difícil situação criada pela cedência à megalomania do espírito da época e da incipiente opinião pública dos cafés e tascas de Lisboa. 
Nos finais do século XIX e apesar do seu apogeu imperial, a Grã-Bretanha, via despontar na cena internacional um perigoso contendor - o Império Alemão -, que mercê da ocupação de um espaço territorial central na Europa e de um arranque industrial sem precedentes, ascendia à condição de grande potência continental com legítimas pretensões à obtenção de um lugar ao sol na partilha colonial. A nova realidade que a abertura de mercados propiciou às sociedades industrializadas na Inglaterra, Alemanha, França ou Bélgica, impeliu à criação de uma miríade de sociedades e companhias de índole comercial e colonial, que passaram a encarar o continente negro como uma clara possibilidade de expansão e obtenção de vultosos lucros propiciados pela extracção de matérias-primas e estabelecimento de entrepostos europeus. As próprias inovações tecnológicas - a electricidade, as armas automáticas, os caminhos de ferro ou os avanços da medicina - , aliavam-se ao espírito positivista da época que via o homem branco, como o promotor da civilização de gentes entregues ao primitivismo tribal e a incompreendidas formas de organização social, política e económica. 
No período de consolidação do sistema liberal-parlamentar - a Regeneração -, deu-se  em Portugal um relevante arranque na modernização de infra-estruturas que abriu o país às novidades materiais do século. Simultaneamente,  entravam também as obras de cariz científico e lúdico que entusiasmaram leitores de uma geração que ansiava pela restauração do prestígio e poder, obras essas onde o espírito de aventura, o denodo dos valorosos e a consagração de novos heróis, era susceptível de estimular ímpetos que prolongassem uma vez mais no ultramar, o já longínquo destino aberto pela epopeia dos Descobrimentos.
Após a criação da Sociedade Livre do Congo, Portugal teve a necessidade de negociar com poderes imperiais que almejavam ao rápido estabelecimento de zonas de influência em África e sendo o aliado preferencial da Inglaterra, conseguiu no difícil jogo de equilíbrio, uma inicial benevolência britânica quanto ao domínio da desembocadura do rio Congo. Sendo este a principal via de penetração na África Central, a pretensão portuguesa - baseada no argumento dos direitos históricos -, foi de imediato contestada por franceses, belgas e alemães que  pretendiam a partilha da bacia do Congo em áreas de influência. Os ingleses, visando o reconhecimento internacional dos seus interesses na África do Sul - onde as repúblicas boéres consistiam num permanente ponto de contestação aos desígnios expansionistas de Londres -, viram-se obrigados a contemporizar com os seus concorrentes e deixaram de apoiar as desmedidas pretensões portuguesas ao total domínio da zona. Reagindo, Portugal solicitou a realização de uma conferência internacional - o Congresso de Berlim - que viria afinal, a reconhecer o princípio da ocupação de facto de territórios, em detrimento de direitos históricos jamais formalmente aceites por todos.
A propósito das possibilidades portuguesas no momento da "corrida a África", Andrade Corvo escrevia: ..."a este propósito parece-nos oportuno - embora seja mal visto para os que sonham com impérios sem limites, não pensando um instante em melhorar o que é realmente nosso, nem na força que é necessária para dominar e defender territórios vastíssimos-, lembrar quanto é perigosa a fantasia, quanto é pouco prudente a pretensão de supormos nossa toda a África Central e Austral, de um a outro mar" (1)... Segundo este ministro, a estratégia portuguesa devia consistir  em ..."abrir largamente as portas ao comércio, às actividades de todos os géneros, seja qual for a sua procedência; atrair por todos os meios de sedução a emigração nacional ou estrangeira, europeia ou asiática; varrer todos os monopólios, seja qual for a marca com que se disfarcem, ou os pretextos por que busquem justificar-se; fazer, especialmente, concessões aconselhadas pela prudência, que não tolham em caso algum a livre concorrência; são regras que a razão e a experiência, nossa e estranha, estão aconselhando por numerosos exemplos e prósperos resultados"...  Consciente dos perigos decorrentes do envolvimento de Portugal nos complicados e perigosos jogos de alianças na Europa, Andrade Corvo salientava ainda,  que ..."as tradições da nossa política e os importantes e valiosos interesses que nos unem à Inglaterra são poderosas razões, para que não deixemos afrouxar os vínculos de aliança que nos unem àquela potência"... e que Portugal, sendo uma potência de segunda ordem,  ..."além de bom governo, boa política e boa administração, precisa de boas alianças"..., no nosso caso, o poder marítimo dominante: o Reino Unido.
Na década de oitenta do século XIX, a generalidade dos políticos e da opinião pública portuguesa, apoiava ansiosamente qualquer projecto que visasse o mitigar a influência britânica e entusiasticamente passou a ver nos reivindicadores da criação de um novo Brasil em África - o Mapa Cor de Rosa -, os firmes esteios da libertação daquela tutela. Contudo, as forças em confrontos eram ainda poderosamente favoráveis à Inglaterra. Derrotada pelos alemães em 1870-71, a França  era uma potência continental que necessitava da Rússia como contraponto à hegemonia militar da aliança germano-austríaca das Potências Centrais, na qual participava ainda a também recentemente unificada Itália. A Royal Navy era ainda o poder marítimo supremo em todos os oceanos do planeta, manifestando uma esmagadora superioridade de efectivos e de argumentos técnicos em presença. Qualquer pretensão de domínio colonial, teria que forçosamente contar com o beneplácito britânico. 
Seguindo alguns indicadores económicos e a nova mas enganadora relação de forças apresentada pelo grande bloco que se constituíra na Europa Central, o ministro Barros Gomes julgou azado o momento, para uma aproximação ao poder continental dominante - a Alemanha -, que manifestava interesse em contestar aos ingleses o seu predomínio em amplas zonas da África Austral. A existência de o sempre latente conflito anglo-boer, seria para Barros Gomes, outro motivo para aquela aproximação, criando dificuldades às reivindicações britânicas na área e propiciando a possível criação de uma grande colónia portuguesa que servisse de "Estado tampão" entre os poderes imperialistas em disputa. Contudo, o estado de acelerado desenvolvimento e organização das companhias majestáticas britânicas na África do Sul, conduziu ao alinhamento da política do governo britânico com as pretensões daquelas, onde pontificava o aventureiro Cecil Rhodes, talvez o protótipo do empresário aventureiro dos finais do século XIX ao serviço de um desígnio imperial. 
O efervescer e radicalizar dos "centros de opinião" lisboetas - as sedes partidárias, os cafés do Rossio e a Sociedade de Geografia - , também condicionados pela demagogia do minoritário partido republicano, impeliu o governo à formal apresentação das reivindicações portuguesas sobre o hinterland austral, seguindo-se o envio de ordens para a apressada celebração de tratados com os potentados locais que colocassem amplos territórios sobre nominal soberania portuguesa.  Conhecedor da realidade no terreno e do perigo que representava para a Inglaterra o ruir do seu projecto Cabo-Cairo - e procurando cercear as veleidades independentistas das repúblicas boéres -, o governo britânico reagiu. O Ultimatum de 1890 deixou o país numa situação muito difícil, pois o projecto de Andrade Corvo teria sido susceptível de tranquilizar a posição britânica, obtendo mais vantagens territoriais e até uma prevista ligação fluvial entre Angola e Moçambique. Nos meses imediatos à nota de Londres, o Parlamento rejeitou um acordo que incluía essa ligação pelo Zambeze e ainda assim, os britânicos cederam uma parte do planalto de Manica, permanecendo sob soberania portuguesa Lourenço Marques e amplos territórios que o país custosamente ocuparia, dada a exiguidade de possibilidades demográficas e económicas. A pergunta que legitimamente se coloca é a seguinte: o que teria sucedido se o governo de Lisboa, pressionado pela histeria das ruas, não tivesse emitido as ordens que acabou por enviar para Moçambique?  A resposta parece ser, como é óbvio, a efectivação de uma decidida intervenção militar inglesa e a consequente ocupação da maior parte dos territórios ultramarinos portugueses. O que o Ultimatum deixou a Portugal, consistiu afinal numa extensíssima propriedade imperial, de uma dimensão absolutamente desproporcionada para o real poder de um país que beneficiou de uma situação muito privilegiada, se a compararmos com as rivais Alemanha e Itália. Se à época não aconteceu o definitivo ocaso da aventura ultramarina nacional, tal se deveu exactamente, ao desejo britânico de não entregar importantes parcelas africanas a potenciais inimigos, mantendo-as assim, na sua esfera de influência. O perigo da perturbação do equilíbrio europeu, a moderação aconselhada pela rainha Vitória e o desejo da obtenção de um modus vivendi  com o tradicional aliado português - onde D. Carlos I iniciava o seu reinado -, conduziram directamente à possibilidade das campanhas de ocupação, onde efectivamente, Portugal procedeu a um esforço sem precedentes e perfeitamente consagrado pelo êxito militar que espantou as potências, algumas das quais, como a Itália na Abissínia  e a própria Inglaterra na Zululândia e no Sudão, foram derrotadas por  exércitos nativos. A renovação da aliança luso-britânica e o bom entendimento estabelecido entre D. Carlos e os ingleses, impediram o esbulhar do património nacional, que chegaria praticamente intacto até 1975. Não se limitando à zona central de Moçambique, as campanhas de pacificação estenderam-se a Angola e ao Estado da Índia, criando novos sonhos de grandeza numa população urbana que aguardava ansiosamente a chegada das expedições, como uma prova do valor e pujança da Pátria. Foi a época de todas as ilusões e de todas as esperanças. A baixa política, a demagogia infrene e a violência iconoclasta daquele tempo, em breve conduziriam Portugal a uma situação de desesperada anarquia, ruína económica, prepotência partidária e ao século XX que bem conhecemos. Foi esta a verdade do Ultimatum. Tudo o mais, é mero objecto do desconhecimento e da paixão partidária.

(1) O Mapa Cor de Rosa

A seguir: o Ultimatum britânico à França: o episódio de Fachoda e a capitulação de Paris.