sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

CRONIQUETAS REPUBLICANAS

1. O Hino do PS ou Manuel Alegre revisitado

"Levanta a voz, camarada
Vem cantar nossa vitória,
Bandeiras rubras são história,
Nossa luta é tudo ou nada,
Se nas fábricas e nos campos,
Camaradas somos o povo,
Todos juntos somos tantos
Pra fazer um tempo novo!
(refrão)
Nem capital nem ditadura!
Nem monopólios nem tortura!
A vitória duma vontade,
Socialismo em liberdade!
(repete)

Todo este entusiasmo, acompanhado de rufar de tambores e sinos natalícios, transporta-nos para um qualquer shangri-la radioso e plausível. A letra é indubitavelmente de Manuel Alegre e sintetiza a sua visão do PS, aquele "PS à PS", que na falta de um antepassado em linha recta, descende colateralmente do costismo da 1ª república, onde o histrionismo camufla habilmente a exigível coerência mínima.

O grupo Alegre do Partido Socialista, é isto mesmo, resumindo-se a frases inflamadas, indignações postiças e sobretudo, grandes tiradas patuleias de promessas redentoras. Na política partidária portuguesa, a apregoada ética republicana, limita-se ao bem conhecido fazer de conta. É que o faz de conta adormece ímpetos e serve de biombo a manobras pouco consentâneas com reivindicados princípios basilares da organização de clube.

São os vigilantes da ortodoxia ditada pela necessidade da aparência, do politicamente correcto estabelecido por lutas que pouca gente conheceu, porque na maior parte são simples mitos. Os herdeiros das lutas do pau travadas pelos "formigas brancas" do extinto p.r.p, pretendem conservar aquilo, que para os saudosistas de um tempo que não conheceram, é fundamental. Um igualitarismo que eles próprios não praticam, porque desdenham do povo que não souberam formar. Uma fraternidade que exclui todos aqueles que não pertençam à confraria. E uma liberdade condescendente e no condicional, isto é, que obrigue ao reconhecimento por parte dos exógenos, da listagem de dogmas sacrossantos e intocáveis.

O PS à PS resume-se a isto, ou seja, fazer de conta de que pertence a uma "esquerda" já há muito desaparecida da história. Ao fazer de conta de que nada deve aos amigos americanos e alemães de 75 e enfim, em cismar na fé e ilusão daquela velha palavra de ordem gritada até à exaustão na Alameda, ..."aqui só há um, o PS e mais nenhum"..., recebida em silêncio pela maioria dos manifestantes naquele tórrido verão de todas as decisões.

Entre uns tiros certeiros ou falhados numa coutada alentejana, ou entre a estreia do Loden novo e da cartucheira comprada no Rossio, há sempre tempo para uma forte cachimbada à volta de uma fogueira onde rechina no espeto, um javali acabado de caçar no Pingo Doce. Um vinhito de 90 Euros a garrafa, uma feijoada daquelas como D. Carlos tanto apreciava e por fim, duas ou três garrafitas de digestivo caseiro, propiciam uma longa noite de declamações poéticas e quiçá, de um ou outro desafinado fado em que as touradas reais e o Embuçado inevitavelmente marcam presença.

Adoro o PS à PS. É cá dos nossos e não nos aborrece com spreads, indicadores macroeconómicos, transitários entre ministérios e bancos e outras coisas desta terceira e tão modernaça república. A "plutocracia"(termo tão do agrado de Mário Soares e Benito Mussolini) não faz o nosso género, nada mesmo.

Viva Manuel Alegre! Queiram ou não queiram, é o último senhor e isso diz tudo.

2 comentários:

Samuel de Paiva Pires disse...

Pois é, é aquele PS daquela "gente" conhecida por esquerda caviar...

A cada post fico cada vez mais contente por nos deixares partilhar da mestria com que nos deixas presos a estes fenomenais e certeiros textos!

Paulo Soska Oliveira disse...

Ena pá...
Isto anda a ter aqui textos de gente crescida :)

Fico contente pelas novas inclusões na equipa.