
As tradicionais disputas tribais que durante décadas pareceram desvanecer-se devido à presença portuguesa, regressaram com inaudita violência, que sucessora da guerrilha contra a ocupação indonésia, possui características muito próprias. É que hoje, o móbil do conflito é de difícil classificação, não se enquadrando no quadro da sublevação armada de cariz ideológico - ou de luta contra uma potência estrangeira -, nem de revolta das populações contra um regime opressor.
A república de Timor-Leste, foi criada do nada, do vazio deixado por duas potências coloniais. A primeira delas, Portugal, pela introdução e posterior consolidação do elemento religioso, deu consistência ao aglomerado tribal que pelo catolicismo, divergia claramente do conjunto muçulmano envolvente. O triste abandono das responsabilidades por parte das autoridades de Lisboa (1975), exactamente numa das fases mais agudas do conflito este-oeste, tornou inevitável a intervenção armada da Indonésia, que desrespeitando o que era convencionado tacitamente pela ONU , ocupou e anexou o território.
Os anos de Timor como província da república da Indonésia, logicamente não criaram as condições para a construção de estruturas que viabilizassem uma futura independência. Desta forma, o autêntico vazio de poder, só pode ser colmatado, pela presença de forças estrangeiras que garantam a segurança mínima da população, dos bens e da própria autoridade político-administrativa. É aquilo a que de forma simplista poderemos chamar de "Estado em construção".
Os preconceitos decorrentes da nova realidade internacional pós-1945, impossibilitaram no ano do referendo para a autodeterminação, a terceira pergunta que era necessário colocar nos boletins de voto. Pergunta que aliás, estaria na mente da maioria dos timorenses, ou seja, uma forma de união política à antiga potência colonial. Portugal decerto tem capacidade para uma mais estreita colaboração na organização da administração pública do território e na formação de quadros, desde as forças armadas, ao ensino e saúde.
No entanto, a segurança deveria continuar a ser garantida por forças destacadas pelas Nações Unidas, ao mesmo tempo que as F.A.P. re-orientariam os recursos hoje disponíveis noutros cenários de intervenção. O aparente desinteresse internacional por tudo aquilo a que quase semanalmente assistimos através dos noticiários, não é susceptível de augurar um futuro tranquilizador. A própria disputa acerca das riquezas naturais timorenses, está longe do seu epílogo e de um acordo definitivo entre as partes interessadas (Austrália, Indonésia e Timor).
Um último factor não negligenciável, será a ameaça de desestabilização das zonas vizinhas, isto é, de Timor ocidental e de outras ilhas do arquipélago indonésio. As ambições locais de maior autonomia e até de independência, poderão levar a uma segunda intervenção dos sectores militares, que em Jacarta, decerto não tolerarão qualquer outra secessão do conjunto herdado do antigo império holandês.
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