quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Tony Obama

As eleições americanas são, tal como os óscares, uma oportunidade excelente para o preenchimento de espaço informativo. À falta de melhor noticiário, dissecam-se os candidatos, escrutinam-se os apoios, contam-se espingardas. No entanto, a corrida à Casa Branca mais se assemelha a uma corrida de cavalos num qualquer hipódromo. Se a cavalgadura empresta a magia à competição, o jokey é afinal, o elemento decisivo, pela relação que tem com o bicho, pelo domínio técnico da corrida e também, pelas suas características físicas. Deve ser um peso leve e hábil a manobrar.

Os partidos republicano e democrático encontram-se numa renhida disputa interna pela escolha do jokey a apresentar às eleições. Se no lado republicano tudo parece decidido a favor de McCain, os democratas, com o horizonte de uma vitória já anunciada, hesitam entre a sra. Clinton e Obama.

Ontem, foi a vez de Medeiros Ferreira fazer a sua aposta e Obama parece ser a escolha natural, porque preenche os requisitos já há muito estabelecidos para um candidato da "esquerda"americana. Comparam-no a J.F.Kennedy, sorri reflexivamente como Carter e veste-se bem. Se a isto acrescentarmos uma alegada negritude ao estilo de Harry Belafonte e as suas origens remotamente ligadas a uma tribo perdida africana, faz o pleno do politicamente correcto. É bastante conservador, acalma e ilude a população afro-americana e fica bem na fotografia que a CNN e a CBS decerto venderão ao resto do mundo.

O que nos parece estranho, é este súbito entusiasmo da esquerda portuguesa. Esquecidos os chamados anos dourados da presidência de Clinton, apostam num homem que é uma incógnita. Ainda nada de consistente disse no que respeita à grande política internacional e se formos ao fulcro da questão do momento, o Iraque é apenas uma mera hipótese de estudo para uma decisão futura. Isto não quer dizer coisa alguma, mas os candidatos americanos, não são em regra, homens que se comprometam facilmente na definição em termos absolutos, da política a seguir.

É que os grandes interesses - tanto políticos, como económicos -, são quem tem a última palavra a dizer. Não podemos imaginar a tomada de decisões sem a prévia consulta de todas as partes directamente interessadas, desde a administração corrente, até aos lóbis omnipresentes no Congresso, Senado, organizações patronais, grande indústria, bolsa e comunicação social.

Obama é conservador e prova disso, é a irresistível atracção que exerce sobre uma franja não negligenciável dos republicanos. Mesmo a sua imagem, parece absolutamente convincente e genuína. A forma de vestir, a sua casa e família, não são consequência de uma varinha de condão dos image makers contratados às agências competentes. Obama atrai os conservadores, pela autenticidade. Tem tudo para afastar a nossa "esquerda" doméstica, sempre à procura de um híbrido de Bonaparte com Afonso Costa.

Abandonando a sra. Clinton, aposta no costumeiro parece bem, não dando qualquer importância às tiradas do candidato acerca dos "valores da família, moral e propriedade". No entanto, Obama não é branco e para cúmulo da felicidade, não é um homem que ameaça a ordem estabelecida. Sendo um afro-americano, é refém dos conservadores que decerto não deixarão de escrutiná-lo, de suspeitar e de imaginar o pior cenário possível: o eterno terror da invasão dos subúrbios brancos, pelas hordas de "coloured people".

Obama oferece o dique de salvação e tem outras vantagens. É que na clara luta pela hegemonia em África, o candidato será um excelente ponto de apoio das empresas norte-americanas, junto dos instáveis regimes vigentes na generalidade dos países alvo de penetração económica. A concorrência chinesa é forte e em termos de marketing politico, Obama será decerto inultrapassável. Longe vai a época do sonho maoísta de colectivização das machambas africanas.

Neste contexto, a comparação ontem feita por Medeiros Ferreira, suspeitando ver em Obama um segundo Tony Blair, parece fazer algum sentido. Isto, num primeiro e impulsivo momento de entusiasmo eleitoral. Porque na verdade, Blair, naquilo que interessa e é visível para o americano comum, é o aliado de Bush na aventura iraquiana, facto que decerto Obama não desconhece. Este é o ponto essencial para os eleitores. Se Obama decidir num qualquer debate televisivo, vincar uma política de continuidade - como Blair sempre fez -, perderá qualquer hipótese de vencer Clinton. Muitos outros factores há que ter em conta, mas a similitude entre o ex-Premier britânico e o "smiling candidate" é exactamente e apenas essa: o sorriso fácil. E nada enigmático.

Um comentário:

JNAS disse...

Já não bastava a mestria de um Castelo-Branco, o Miguel, e agora surge-nos um segundo de seu nome Nuno. Bem sei que o blog é colectivo mas só à conta deste autor já está nos meus favoritos. Se vos interessa o fenómeno eleitoral Americano visitem o nosso blog www.ilhas.blogspot.com onde esta questão tem sido o combustível dos últimos tempos. Bem hajam os irmãos Castelo-Branco
Saudações Açorianas aqui da Ilha do Arcanjo São Miguel
JNAS
João Nuno Almeida e Sousa